Turmas multisseriadas no ensino básico brasileiro
o que (não) sabemos e uma agenda para o Novo Plano Nacional de Educação
Resumo
Turmas multisseriadas são aquelas nas quais alunos de mais de uma série são alocados na mesma sala de aula. Em 2019, havia mais de 80 mil dessas turmas no Brasil, contemplando mais de 1,2 milhão de alunos. Este estudo se concentra nos dois terços destas que não incluem alunos da educação infantil – as chamadas turmas multi. Descrevemos as características dos alunos, professores e gestores associados às turmas multi com base no Censo Escolar 2019, contrapondo essas turmas às unisseriadas no contexto do ensino fundamental. Essa análise revela uma concentração espacial relevante das turmas multi em certos estados e municípios – em alguns dos quais chegam a representar mais de 60% das matrículas. De um lado, turmas multi envolvem vários desafios adicionais em relação às unisseriadas: cada docente precisa não apenas dominar uma gama muito mais ampla de conteúdos, como ainda ser capaz de ensinálos simultaneamente – o que exige formação específica, como confirmamos mediante entrevistas com 55 docentes de Manicoré, Amazonas. De outro lado, essas turmas se concentram em regiões com menos recursos, em escolas com piores condições de infraestrutura e nas quais menos docentes têm formação específica, além de serem menos experientes e acumularem funções. Discutimos ainda como o fato de turmas multisseriadas não serem avaliadas pelo Sistema de Avaliação da Educação Básica implica uma série de desafios para políticas de promoção de equidade, desde falta de conhecimento sobre a proficiência desses alunos até incentivos perversos que levam essas turmas a serem negligenciadas por recursos e formações das secretarias de educação. Por fim, utilizamos um modelo estatístico para prever o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica das turmas multi e conjecturamos como sua inclusão nesse índice afetaria o nosso entendimento sobre proficiência e a distribuição de recursos da educação básica.